segunda-feira, 18 de novembro de 2013

A música e o desenvolvimento afetivo


Um outro campo de desenvolvimento é o que lida com a afetividade humana. Muitas vezes menosprezado por nossa sociedade tecnicista, é nele que os efeitos da prática musical se mostram mais claros, independendo de pesquisas e experimentos. Todos nós que lidamos com crianças percebemos isso. O que tem mudado é que agora estes efeitos têm sido estudados cientificamente também.

Em pesquisa realizada na Universidade de Toronto, Sandra Trehub (apud CAVALCANTE, 2004) comprovou algo que muitos pais e educadores já imaginavam: os bebês tendem a permanecer mais calmos quando expostos a uma melodia serena e, dependendo da aceleração do andamento da música, ficam mais alertas.

Nossas avós também já sabiam que colocar um bebê do lado esquerdo, junto ao peito, o deixa mais calmo. A explicação científica é que nessa posição ele sente as batidas do coração de quem o está segurando, o que remete ao que ele ouvia ainda no útero, isto é, o coração da mãe. Além disso, a eficácia das canções de ninar é prova de que música e afeto se unem em uma mágica alquimia para a criança. Muitas vezes, mesmo já adultos, nossas melhores lembranças de situação de acolhimento e carinho dizem respeito às nossas memórias musicais. Já presenciamos vivências em grupos de professores que, a princípio, não apresentavam memórias de sua primeira infância. Ao ouvirem certos acalantos, contudo, emocionaram-se e passaram a relatar situações acontecidas há muito tempo, depois confirmadas por suas mães.

Por todas essas razões, a linguagem musical tem sido apontada como uma das áreas de conhecimentos mais importantes a serem trabalhadas na Educação Infantil, ao lado da linguagem oral e escrita, do movimento, das artes visuais, da matemática e das ciências humanas e naturais. Em países com mais tradição que o Brasil no campo da educação da criança pequena, a música recebe destaque nos currículos, como é o caso do Japão e dos países nórdicos. Nesses países, o educador tem, na sua graduação profissional, um espaço considerável dedicado à sua formação musical, inclusive com a prática de um instrumento, além do aprendizado de um grande número de canções. Este é, por sinal, um grande entrave para nós: o espaço destinado à música em grande parte dos currículos de formação de professores é ainda incipiente, quando existe. É preciso investir significativamente na formação estética (e musical, particularmente) de nossos professores, se realmente quisermos obter melhores resultados na educação básica.

Ainda abordando os efeitos da música no campo afetivo, estudos recentes ampliam ainda mais nosso conhecimento a respeito. Zatorre, da Universidade de McGill (Canadá) e Blood, do Massachusetts General Hospital (EUA), desenvolveram uma pesquisa que buscou analisar os efeitos no cérebro de pessoas que ouviam músicas, as quais segundo as mesmas lhes causavam profunda emoção. Verificou-se que ao ouvir estas músicas, as pessoas acionaram exatamente as mesmas partes do cérebro que têm relação com estados de euforia. Segundo esses autores, isso confere à música uma grande relevância biológica, relacionando-a aos circuitos cerebrais ligados ao prazer (2001).

Há também inúmeras experiências na área de saúde, trabalhos em hospitais que utilizam a música como elemento fundamental para o controle da ansiedade dos pacientes. A origem deste trabalho remonta à 2a. Guerra Mundial, quando músicos foram contratados para auxiliar na recuperação de veteranos de guerra por hospitais norte-americanos. Pode-se afirmar que esse foi um grande impulso para a área de musicoterapia, hoje com reconhecimento acadêmico consolidado. É cada vez mais comum a presença da música nestes locais, seja para diminuir a sensação de dor em pacientes depois de uma cirurgia, junto a mulheres em trabalho de parto (para estimular as contrações) ou na estimulação de pacientes com dano cerebral. Nesse sentido, não é exagero afirmar que os efeitos da música sobre os sentimentos humanos estão, cada vez mais, migrando da sabedoria popular para o reconhecimento científico.

Nenhum comentário:

Postar um comentário